11 anos da lei do Sinase: o impacto sobre a Fundação CASA

Artigo do presidente João Veríssimo Fernandes* mostra o que mudou no perfil dos jovens atendidos

 

A Lei 12.594/2012 criou há 11 anos o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), um marco jurídico que regulamentou, de forma complementar ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a execução das medidas socioeducativas para os adolescentes que cometeram ato infracional. O regramento foi promulgado em 18 de janeiro de 2012.

O primeiro passo importante da lei foi ressaltar ser o atendimento socioeducativo um sistema, formado pelos elaboradores da política pública em todos os níveis – União, Estados, municípios e Distrito Federal –, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública, cada qual com suas atribuições e responsabilidades.

A lei, contudo, teve um embrião, a Resolução nº 119/2006 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), documento este que, em São Paulo, foi o norteador da mudança institucional da Fundação CASA, junto à Constituição Federal e ao ECA, passando a se basear no respeito aos direitos humanos das pessoas com idade entre 12 anos e 21 anos incompletos que cometeram ato infracional.

A modificação envolveu a descentralização do atendimento; atenção psicossocial permanente; atenção básica à saúde; ampla agenda pedagógica, com educação escolar, educação profissional básica, arte e cultura e esporte; diagnóstico polidimensional na internação provisória; plano individual de atendimento (PIA) na internação e semiliberdade; padronização dos procedimentos de segurança e disciplina; dentre outros.

As ações renderam, em 2011, o reconhecimento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no programa Justiça ao Jovem, como o melhor sistema socioeducativo do país. Entre 2014 e 2015, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), indicou haver em terras paulistas mais centros socioeducativos salubres, com 89%, enquanto a média da região Sudeste, a maior do país, foi de 77,8%.

Esses anos de vigência da lei impactaram, direta ou indiretamente, o perfil dos adolescentes atendidos. Na época da promulgação do Sinase, a Fundação CASA estava com 31.813 adolescentes anualmente atendidos, chegando ao pico de 33.798 em 2013.

Segundo levantamento interno da Fundação CASA, em 31 de dezembro de 2012, dos 8.008 jovens na Instituição, 96,03% eram do sexo masculino e 3,97% do feminino. A maior parte (78,18%) tinha idade entre 16 e 18 anos; 74,75% estavam nos ensinos Fundamental I e II, sendo que 15,48% ainda se encontravam nas séries iniciais, do 1º ao 5º anos. As cores de pele predominantes eram a parda e a preta, correspondendo a 67,19% do total – os brancos eram 31,83%. Entre os atos infracionais, o predomínio era do tráfico de drogas, com 42,16%, seguido do roubo qualificado, com 37,55%.

Hoje é possível observar algumas mudanças. É inegável a queda no atendimento desde o pico: o ano de 2022 registrou 15.188 adolescentes atendidos, ou seja, 55% a menos do que em 2013.

A redução também levou a Fundação CASA a suspender o funcionamento de 31 centros socioeducativos no Estado entre 2019 e o ano passado. Atualmente, são 116 centros socioeducativos ativos em 46 cidades. Apesar da redução, São Paulo ainda tem o maior sistema de execução do país.

Em 31 de dezembro do ano passado, dos 4.431 atendidos na Fundação CASA, 95,96% eram do gênero masculino e 4,04% do feminino. Apesar da leve elevação, a Instituição manteve o mesmo número de centros femininos no Estado, seis, localizados nas cidades de São Paulo e Cerqueira César.

Embora o perfil da faixa etária não tenha mudado – a faixa predominante ainda é de 16 a 18 anos, com 78,51% –, aumentou o número de jovens de 19 a 20 anos no sistema paulista: eram 2,2% em 2012 e subiu para 3,09% em 2022, uma elevação proporcional de 40,45%.

Pardos e pretos continuam sendo a maioria, com 71,75%, um aumento de mais de quatro pontos percentuais, enquanto o número de brancos reduziu para 27,75%. Isso pode ser um sinal tanto da mudança da consciência sobre a autodeclaração da cor como também um reflexo do racismo estrutural do nosso país.

O tráfico de drogas ainda continua recrutando a nossa juventude, sendo responsável por 40,98% do atos infracionais, seguido do roubo qualificado, com 36,06%. Porém, entre os anos de 2013 e 2016 o roubo qualificado, que é um ato cometido mediante violência e grave ameaça, superou o tráfico de drogas.

Talvez a maior modificação tenha ocorrido no perfil educacional. Em 2022, 42,13% dos adolescentes atendidos estavam cursando o Ensino Médio, um aumento de 27 pontos percentuais em relação a 2012, o que retrata que, pelo perfil da idade do atendimento, eles estavam, em geral, na idade-série correta. Tanto que o número de jovens no Ciclo I do Ensino Fundamental caiu para 3,25% em 2022, uma queda de 12 pontos percentuais. O total de adolescentes no Ciclo II do Ensino Fundamental caiu para 49,56%.

O ideal, na realidade, é que esses adolescentes não ingressem no sistema socioeducativo nem que venhamos a discutir os novos impactos da lei do Sinase. Um dos caminhos é a garantia da proteção integral, como prevê o mandamento constitucional, com prioridade absoluta e compromisso da família, da sociedade e do Estado.

 

*João Veríssimo Fernandes é presidente da Fundação CASA e ex-juiz de Direito

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